Nuno Lima Bastos
Jornal Tribuna de Macau
25 de Setembro de 2008
À medida que vou absorvendo e relacionando os preocupantes sinais que têm surgido de diversos lados sobre o futuro próximo da economia de Macau, fico com a sensação de que o Hagupit, com o rasto de destruição que deixou entre nós, pode ter sido uma espécie de premonição do que está para vir.
Desde logo, no mesmo dia em que acordávamos sob o efeito do tufão, a agência noticiosa oficial chinesa Xinhua publicava um texto assumidamente inquieto sobre o estado do motor da economia do território – o jogo. Depois de citar uma recente peça da Lusa apontando previsões de forte abrandamento na, até agora, inexorável subida das receitas dos casinos locais, com estas a poderem crescer menos de 1% este mês, em comparação com o mesmo período do ano passado, a Xinhua fazia eco de especulações sobre um possível “efeito de dominó” que poderia levar ao sucessivo encerramento de diversos casinos de menor dimensão, arrastando muitos trabalhadores do sector para o desemprego e penalizando as receitas fiscais da região.
Francis Tam já veio tentar pôr água na fervura, como seria de esperar de um responsável governamental. Certo é, no entanto, que o próprio Chefe do Executivo admitira já, perante a Assembleia Legislativa, que a euforia do jogo no território poderia começar a abrandar a curto prazo.
Mas os sinais já vêm de trás. Por exemplo, as reputadas Financial Times e Asia Times Online haviam também lançado nuvens cinzentas sobre Macau em artigos publicados entre o final de Agosto e o início do corrente mês. A primeira recordava a perda de um quarto do valor das acções da Sociedade de Jogos de Macau desde a sua entrada na Bolsa de Valores de Hong Kong e a quebra de quase 70% na cotação das suas concorrentes desde os registos máximos bolsistas alcançados há cerca um ano – e isto antes de se sentirem os efeitos das novas restrições do continente à emissão de vistos individuais para as duas RAE. A esta situação, acrescentava a Asia Times Online a fortíssima concorrência entre as seis operadoras de jogo e o consequente aumento dos respectivos custos de operação, assim como a previsível concorrência que começará a vir de fora, com a inauguração do Marina Sands em Singapura e a esperada abertura ao jogo de diversas jurisdições próximas.
Assim, o ainda fresco despedimento colectivo da Galaxy Resorts poderá ser imitado mais cedo do que se pensa, tanto mais que dramas de grandes proporções como o escândalo dos produtos lácteos do continente com melamina e as ondas de choque a nível mundial da crise financeira americana poderão constituir barreiras psicológicas aos turistas e apostadores chineses tão ou mais eficazes do que as restrições governamentais à emissão de vistos individuais. Veja-se o que aconteceu aquando da SARS.
À previsível crise de crescimento no jogo poderá juntar-se uma nova crise imobiliária. Alguns especialistas têm insinuado já uma quebra entre 15% e 20% no mercado local desde Dezembro passado, tanto nos preços de venda, como nos valores das rendas. E questionam sobremaneira as possibilidades de escoamento da crescente oferta de habitação de luxo no território. A pergunta é simples: haverá assim tantos compradores endinheirados que desejem possuir um faustoso apartamento em Macau, quando têm tantas alternativas de qualidade noutras regiões próximas? Se procuram uma habitação para férias, há lugares muito mais adequados e aprazíveis. Se tencionam simplesmente investir, já vêm tarde, dado o efeito especulativo dos últimos anos. Ainda para mais, com as consequências internacionais da crise do crédito imobiliário americano ainda não totalmente contabilizadas.
Como se não bastasse, some-se a tudo isto o descrédito do Governo local junto de Pequim. Edmund Ho bem tenta algumas operações de charme, como a atribuição de um pacote de 5 500 milhões de patacas para apoio à reconstrução de Sichuan ou de 150 000 dólares de Hong Kong a cada um dos atletas chineses que receberam medalhas de ouro nos Jogos Olímpicos, mas já vai tarde. São medidas que sensibilizam a populaça (e a primeira é louvável em termos humanitários, desde que a utilização do dinheiro seja devidamente fiscalizada), mas que não vão obstar a que a equipa governativa desça do palco pela porta pequena daqui a um ano (e não tivesse Tung Chee Hwa caído...).
Não é de admirar que muitos habitantes de Macau estejam tão susceptíveis e, ao mínimo boato, desatem a correr às agências do Banco Luso Internacional e do Banco Wing Hang para levantar as suas economias. É que os efeitos do Hagupit nem um dia duraram, mas o que está para vir vai durar muito mais. Oxalá me engane...
quinta-feira, 25 de setembro de 2008
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