Nuno Lima Bastos
Jornal Tribuna de Macau
12 de Junho de 2009
Parece sina: não há 10 em Junho em Macau sem uma valente molha! Este ano, felizmente, a “banhada” não foi total, já que houve bastante mais sobriedade e objectividade nas intervenções públicas do que em anos anteriores. Desde logo, nas diversas alocuções do representante do Governo Português, Fernando Sarrasqueiro, que exibiu um conhecimento de causa e uma sensatez na abordagem dos assuntos a que estávamos pouco habituados. Não veio resolver nada, mas esteve bem na função essencialmente decorativa (sem qualquer sentido pejorativo) que lhe estava reservada.
A Chefe do Executivo em exercício também fez uma agradável prédica na recepção do final da tarde, descontraída quanto baste e com a vantagem de dispensar tradução. Só é pena que a plateia nunca consiga observar um pouco mais de silêncio nesses momentos...
Não parece haver muito mais a dizer sobre este Dia de Portugal. Talvez porque, como escreveu Eça de Queirós e relembrou António Barreto, presidente da comissão organizadora das celebrações, «as festas decretadas, impostas por lei, nunca se tornam populares». É claro que também festejamos o nosso enorme Camões e as nossas comunidades espalhadas pela diáspora – logo, a data é igualmente um tributo aos que aqui vivem ‑, mas há qualquer coisa que falta para tornar o 10 de Junho verdadeiramente especial neste cantinho do mundo.
De resto, falei com diversos compatriotas ao longo do dia e cedo me apercebi do alheamento dominante. Até iriam ao içar da bandeira se não fosse dia de trabalho, mas nada mais.
Aliás, não é verdade que, ainda no último fim-de-semana, menos de duzentas pessoas foram exercer o seu dever cívico nas eleições para o Parlamento Europeu? Seguramente que essa é uma realidade muito distante – basta ver a escassa cobertura que a campanha eleitoral aqui teve ‑, mas não deixa de ser um quase privilégio podermos intervir nesse processo apesar de não vivermos no espaço europeu; privilégio, no entanto, esbanjado por quase todos nós... (num exemplo de sentido contrário, eu e as centenas de milhar de madeirenses espalhados pelos quatro cantos do globo não podemos eleger os deputados à Assembleia Legislativa Regional da Madeira se lá não estivermos recenseados. Fosse-me dada a possibilidade de o fazer a partir daqui e não a enjeitaria, com toda a certeza...).
Julgo que do que precisamos para nos mobilizar e dar a este dia a sua merecida dimensão é de o transformar numa montra de Portugal para toda a população do território; até para tentar aproximar um pouco mais aqueles 115 000 inscritos no consulado do país que lhes reconheceu uma, em qualquer outra paragem, improvável nacionalidade. Neste sentido, há perto de um ano, escrevi: «não seria muito mais interessante e gratificante para todos nós que, em vez de uma recepção aberta no antigo Belavista (ou a par dela), houvesse uma celebração alargada no Largo do Senado, onde fossem dados a conhecer a história, a cultura e os produtos portugueses – incluindo dois dos mais apreciados, a gastronomia e o desporto? Não falo apenas de uma espécie de feira, mas de algo bem mais elaborado: painéis com fotografias do nosso país e informação em várias línguas, um ecrã gigante com vídeos das diferentes regiões do país e dos muitos eventos internacionais que ali têm decorrido na última década (e tenho visto alguns muito bem conseguidos da responsabilidade do Turismo de Portugal, I.P.), balcões de empresas portuguesas e dos seus produtos, um palco onde decorressem iniciativas culturais e intervenções oportunas de representantes do Governo português, etc. Ambicioso? Talvez. Impossível? De modo nenhum! É uma questão de se começar. Se um projecto destes tiver receptividade das autoridades, empresas e associações portuguesas, poderá crescer paulatinamente e assumir-se como um grande evento dentro de poucos anos».
Ainda não foi desta. Talvez não seja nos próximos anos. Algumas estruturas associativas locais bem se têm esforçado em diversas actividades, mas falta qualquer coisa de mais abrangente e mais aberta ao resto de Macau. Tínhamos todos a ganhar com isso. Fica a esperança de que um dia, com governantes de vistas mais largas em Lisboa, lá cheguemos. Aí, sim, o 10 de Junho será um momento alto de Portugal entre nós.
Nota: agradeço ao Bairro do Oriente a divulgação desta crónica na sua habitual rubrica «Leituras».
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